A educação entrou na vida de Vitalina por conta de sua mãe, dona Georgina Maria, falecida em 31 de dezembro passado. Uma mulher que não teve acesso à educação formal, mas a valorizava – e muito. Exigia que os sete filhos estudassem e aconselhou Vitalina a fazer magistério, “porque professor não fica desempregado”, como recorda a filha premiada.
Vitalina e a mãe deixaram Conceição de Feira quando ela era criança para buscar tratamento para a irmã caçula, vítima de paralisia infantil. Formou-se em magistério, ensinou em escolas públicas e privadas e cursou Letras na Ufba, antes de se mudar para Camaçari, em 2010, onde implementou o projeto que lhe rendeu o LED – Luz Para a Educação, na categoria Educação.
“Eu não trabalhei a vida inteira com questões étnico- raciais porque nao tinha compreensão da importância dessas questões. Fui muito pautada e sacudida por meu filho, que trouxe questões do pré-vestibular da Steve Biko, onde eles trabalham muito questionamentos sobre o lugar do negro do mundo, o negro na Bahia, os históricos apagados dos livros didáticos. Ele me fez compreender a necessidade que tinha de entender, estudar, porque muitas das questões eu não sabia resolver”, conta Vitalina, mãe de dois casais de gêmeos, além de uma enteada.
À época que começou a receber as provocações vindas do filho, a Lei 10.639, que rege a obrigatoriedade do ensino de cultura afrobrasileira nas escolas públicas, já estava em vigor. Ela, no entanto, confessa que nunca tinha trabalhado nesse ponto – algo já em prática em várias escolas.
O divisor de águas foi quando um de seus alunos foi baleado na perna após uma ação policial. O garoto ficou internado por semanas e o assunto chegou à sala de aula. Vitalina percebeu que seus alunos negros acumulavam histórias de violência policial: “Eles disputavam em sala de quem tinha apanhado mais é isso me chocou profundamente”, recorda.
“Entendi que aquilo poderia acontecer com meu filho, sobrinhos. Falei sobre o ECA, que ninguém tinha direito de violentar corpos por serem pretos”, afirma a educadora, que propôs à coordenação realizar um trabalho com esta temática, na escola São Tomaz de Cantuária, em 2018. Ali iniciou a sua iniciativa antirracista.
Novos ares
Vitalina diz que não entende as justificativas até hoje. Foi realocada para um de seus trabalhos atual, o Centro Educacional Maria Quitéria, onde percebeu um outro ambiente: docentes e discentes mais engajados e presentes.
“Esses estudantes – a partir de todo conhecimento que adquiriram, já começam a fazer esse enfrentamento contra o racismo”, afirma Iara, acrescentndo que as ações estão transformando a visão de mundo dos alunos.
Com o Prêmio LED 2023 no currículo, as ações serão incrementadas. Entre elas, a construção de murais dentro das escolas e o estímulo à leitura de escritores e escritoras negras. O prêmio contemplou seis iniciativas com um aporte financeiro de R$ 200 mil, que serão revertidos em mais livros e melhoria na estrutura da escola para que o projeto pedagógico continue sendo implementado.
“Quando inscrevi esse projeto no Prêmio LED, o fiz com o desejo de inspirar outras redes. Seguiremos buscando referenciar outras escolas, outros profissionais, outros cidadãos, através do nosso trabalho integrado e multidisciplinar, pois toda comunidade escolar está unida nesse propósito, cada um contribuindo para a efetividade desse projeto de educação antirracista”, destaca Vitalina. Correio da Bahia